Geodiversidade

A serra da Estrela é rica em formas, rochas e processos que testemunham uma história geológica única localizada na Zona Centro-Ibérica que, por sua vez, assenta sobre o Maciço Hespérico ocupando a parte central e ocidental da Península Ibérica. O relevo da serra da Estrela corresponde ao orógeno Varisco/Hercínico que resultou do fecho do oceano Rheic (há 280 milhões de anos) e da abertura do Paleotétis (há aproximadamente 500 Ma), sendo o Mar Mediterrâneo a relíquia do Tétis que existiu entre  aproximadamente 250-66 Ma. A Cordilheira Central Ibérica, que integra a serra da Estrela juntamente com a serra do Açor e a serra da Lousã, prolonga-se para as serras espanholas de Gata, Gredos e Guadarrama com direção NE-SW.

Do Neoproterozoico (1000-540 Ma) até o presente, a carta geológica da serra da Estrela é um dos testemunhos de toda a história geológica, cuja geodiversidade e dinâmica é representada pelas suas cores e linhas. Se observar a sua legenda, verá que do topo para a base começamos das unidades mais recentes até as mais antigas. As linhas escuras traçam falhas tectónicas que retalham a serra em compartimentos, possibilitando a formação de escarpas, linhas de água principais e de seus respetivos vales, por vezes, até explicam o cavalgamento e levantamento de um terreno. Dos depósitos mais recentes, temos unidades sedimentares associadas ao transporte fluvial, ao movimento de vertentes e ao passado fluvio-glaciário. Seguimos para formações metassedimentares do neoproterozoico que serão explicadas abaixo. Sendo que ainda durante o neoproterozoico, temos rochas de complexos anatéticos que são rochas metamórficas que sofreram fusão parcial. Por fim, seguimos para uma enorme diversidade de granitos que existem devido ao espessamento crustal da serra.

 

A Geologia do Estrela Geopark viaja no tempo até ao Neoproterozoico (há mais 650 milhões de anos!), sendo que a formação da serra da Estrela pode ser resumida em seis estádios principais:

 

1. A sua origem remonta à acumulação de sedimentos em ambiente marinho no talude continental há mais de 650 Ma.

 

2. O metamorfismo dos sedimentos marinhos levou à formação de rochas metassedimentares do Complexo Xistograuváquico (CXG), Grupo das Beiras, dobradas durante a orogenia Cadomiana (750-540 Ma) no Neoproterozoico.

3. Durante a orogenia Varisca, entre aproximadamente 320 e 290 Ma, ocorreu espessamento crustal por metamorfismo do CXG e intrusão de batólitos graníticos em profundidade, originando também corneanas (xisto cozido por metamorfismo de contacto). A serra também apresenta xistos mosqueados, migmatitos, e filões de doleritos, aplito-pegmatíticos e quartzosos. Excetua-se da orogenia Varisca o Granito de Manteigas (Ordovícico com aproximadamente 480 Ma). Sendo o CXG novamente dobrado. No final da orogenia, o maciço foi afetado pela deformação tectónica frágil, dando origem à duas falhas principais, a falha da Vilariça e falha de Seia com direção NE-SW no Maciço Hespérico. Este maciço fragmentado pela Cordilheira Central divide em dois blocos os sedimentos de cobertura cenozoica em bacias de caráter continental e lacustre, Meseta Norte (Bacia do Douro) e Meseta Sul (Bacia do Tejo e do Sado). Dobras e xistosidades desta orogenia têm como orientação principal NW-SE.

4. A intensa meteorização resultante de um clima quente e húmido levou a formação de espessos rególitos e à deposição de carbonatos em margem continental que, posteriormente, foram removidos com a alteração do clima para árido. Tendo ocorrido erosão e aplanamento da cadeia Varisca entre 300 e 66 Ma.

5. Durante o Miocénico (cerca de 23–5 Ma), e já na orogenia Alpina, as falhas variscas foram reativadas, provocando o soerguimento da Serra da Estrela e da Cordilheira Central Ibérica derivado da colisão da placa africana com a euroasiática durante o Oligocénico (~34–23 Ma). No caso da Serra da Estrela o levantamento do horst ocorreu sob a forma de pop-up e devido ao aplanamento da sua superfície e o seu seccionamento por diversas falhas paralelas, dá à serra a forma de ‘teclas de piano’. As fraturas desta orogenia possuem direção NE-SW ou NNE-SSW. O topo da montanha (Alto da Torre) localiza-se num planalto há 1 993 m de altitude o que destoa do aspeto típico de ‘pico’ o qual as montanhas normalmente possuem. A movimentação tectónica ainda hoje persiste com movimentos ao longo das grandes falhas como provam a ocorrência de nascentes termais e de sismos de baixa magnitude.

6. Por fim, na serra ocorreram glaciações quaternárias. Sendo o último máximo há 30 mil anos onde a altura do glaciar atingiu os 90 m no Alto da Torre. As evidências das glaciações são presentes por quase todo o seu território. Sendo o mais relevante o vale em ‘U’ do rio Zêzere, onde o glaciar teve 11,3 km de extensão, e cuja espessura atingiu os 340 m. Outros testemunhos de glaciação são os circos glaciares e as moreias.

Ainda hoje, as marcas deixadas pelo glaciar moldam a paisagem da serra da Estrela, tornando-a especial. Os vales glaciários atualmente são percorridos por trilhas e linhas de água, atraindo geólogos, caminhantes e curiosos que procuram compreender e usufruir da beleza esculpida pela natureza e pelo tempo.

O Planalto da Torre alimentava os cinco vales glaciários principais: Covão do Urso, Covão Grande, Loriga, Alforfa e Zêzere.

Em suma, a herança deixada pela tectónica ativa ao longo da História geológica na serra da Estrela, juntamente com a sua relação com o clima, fomenta o valor científico do Estrela Geopark, quer pela sua relevância, singularidade e significado, sem esquecer que a geologia local é a base para a biodiversidade única que aqui podemos encontrar, constituindo assim um legado comum que importa salvaguardar e valorizar para a humanidade. 

Para contar essa História geológica, destacam-se os Geossítios, locais de interesse geológico que correspondem a diferentes páginas do grande livro da evolução da Terra. Agrupados em diferentes categorias, de acordo com a sua génese, este locais com elevados valores científico, cénico, educativos ambiental e turístico, permitem ao Estrela Geopark ser um laboratório vivo para a aprendizagem e valorização do património. É na Geodiversidade que o Estrela Geopark tem por base estratégias de desenvolvimento territorial sustentável que permitem inventariar e classificar 147 geogeossítios, distribuídos por todo o seu território.